Abro os olhos muito vagarosamente. Estou encolhido
em posição fetal, e um certo torpor na mente, mas está tão frio...
Viajante Solitário, acorda !
Meus lábios estão rachados e feridos e o orvalho da
noite neles se condensou, quase não sinto minha língua absorve-los revelando
tão somente a fome e sede que sinto. Como adoraria ser um urso hibernando numa
aconchegante toca em meio ao sossego da natureza, e só acordar na primavera,
pois dói muito me locomover por aí, todavia ‚ preciso.
Deus manda-me anjos, almas bondosas que me alimentam
e ainda assim divido com os loucos.
Ou serão sãos ?
Loucura ‚ o que faz uma criatura que encontro em meu
caminho, que de adulto tem apenas a estatura, por trás da arrogância violenta
chora uma criança faminta. De amor.
Vem contra mim, grita, nem sei o que diz.
Lembro palavras que parecem saídas do fundo do meu
coração dizendo que dos tais ‚ o reino dos céus, uma linda frase ! Entretanto
não se pode esquecer que o mesmo homem também disse: "Deixai vir a mim os
pequeninos..!" Culpados são todos os que não dão a essas crianças a
oportunidade de ir até Ele, antes as condenam, matam. Outras surgem e se
revoltam. Ë o ciclo tão combatido por Gandhi, que violência gera violência não
importando de onde tenha surgido primeiro. Homens e mulheres desse país tem de
se unir numa revolução moral e pacífica para que a fome cesse, a sede não
encontre morada e ninguém durma ao relento, mesmo que isto custe mudar todos os
conceitos de sociedade "aceitos" como normais no mundo malicioso,
perdulário e sagaz.
Observei o jovem que a pouco me insultava puxar a
bolsa de uma senhora e ser contido por um transeunte que o derrubou. Ambos se
olharam, via-se que tinham medo um do outro, e então seguiram caminhos opostos.
Fui procura-lo porque vi onde se escondeu. Ele me olhou, surpreso.
- Saiba – eu disse - Eu não sou nada nesse mundo,
mas ninguém nele ‚ melhor do que eu. Por isso digo que você erra em lutar com a
vida, pois ela sempre vencer . Para vencer seja digno. Com a luz da
dignidade você nunca tropeçar .
O vento me impele para longe, cruzando viadutos ou
seguindo por extensas avenidas, indo adiante a minha viagem. Preciso sair dessa
cidade que transpira desigualdade, luz da revolta, mãe da violência, precursora
da morte. Esta a medalha do mal. Ouço Rod Stewart em algum rádio de caminhão na
estrada, sinto um lampejo de alegria e felicidade crescendo em mim e tomando
conta de meu corpo de tal forma que dei pulos, sorri, gargalhei e tudo a minha
volta passou a ser colorido, pessoas sorriam e pássaros me acompanhavam na
canção que surgiu em meus lábios involuntariamente. E para aqueles que
imaginavam que a vida de um viajante solitário fosse triste e dolorida, aí vai
um recado legal: Não é não, tá .
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